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Nissan Leaf: experimentamos o futuro dos automóveis

Nissan Leaf exposto em São Paulo

Guardadas as proporções, hoje tive uma sensação muito semelhante a que experimentei quando manuseei o iPad pela primeira vez. Isso ocorreu em agosto do ano passado e, embora não tivesse compreendido direito as possibilidades daquele tablet, ficou claro que uma nova era do computador pessoal havia começado. E hoje isso aconteceu com o Leaf, da Nissan.

Tal qual o iPad, também o Leaf faz muita coisa igual a seus antepassados. Continua como um veículo de quatro rodas, com posição de dirigir idêntica, arquitetura parecida e função idem. Mas, também como o tablet da Apple, faz a gente enxergar como os equipamentos do século 20 envelheceram. Quem brincou com um iPad hoje vê o PC com seu teclado, mouse e emaranhado de fios como uma peça de museu. Sim, ele tem sua utilidade e ficará por aí por muito tempo, mas o tablet assumiu a posição de computador doméstico e de entretenimento.

Da mesma maneira, os carros  com motor a combustão existirão e duvido que os amantes dos esportivos vão abrir mão deles tão cedo. Talvez apenas quando verem alguns bólidos elétricos passando como foguetes ao seu lado, tamanho pode ser o torque. Mas é justo respeitar a cultura do escapamento, do som do motor e da graxa.

Já se pensarmos no dia a dia, no transporte urbano de casa ao trabalho e vice-versa, o carro elétrico faz um enorme sentido. Não vou nem discutir aqui o problema energético já que, como alguns leitores observaram, não é 100% limpo. Mas você carregar as baterias do carro na garagem, andar num veículo que não emite nada, que é silencioso e que se preocupa em otimizar o desempenho e consumo é extremamente racional.

Ver o Leaf em funcionamento faz a gente pensar em quanta poluição jogamos no ar todos os dias. O local do test-drive (na verdade, uma volta num terreno cheio de pedregulhos) fica ao lado da Marginal Tietê em São Paulo e  é literalmente o cenário oposto ao de uma avenida em que só usássemos modelos elétricos.

Faróis “aerodinâmicos”

A apresentação da Nissan foi longa porque as alterações no cotidiano de um carro elétrico são tantas que as perguntas não paravam de aparecer: “quanto vou gastar de eletricidade para cada carregamento?, “e se quebrar um módulo de bateria?”, “vou precisar de tomada na garagem do meu prédio?”, “qual a vida útil da bateria?”, “ela vicia?”, “qual o gasto de manutenção?” etc.

Sim, o carro elétrico ainda não tem a autonomia ideal e se torna um modelo de planejamento: é preciso pensar no trajeto do dia para saber se dá para ir sem correr riscos. Outra regra é sempre sair de casa com carga máxima. O consultor da Nissan André Maranhão, que testou o carro por vários dias, observou que raramente se carrega o carro do zero: “sempre você chega em casa com alguma autonomia, então o tempo de recarga é menor que o imaginado”.

A infraestrutura é um dos maiores problemas, sem dúvida. O Leaf até carrega numa tomada 110 V, mas leva 20 horas para completar a carga. O ideal é o terminal de 220 V fornecido pela Nissan e que custa US$ 2.000 (o Leaf custa cerca de US$ 32.000 nos EUA, mas pode cair para US$ 20.000 dependendo dos benefícios fiscais).

Com esse terminal, a recarga leva 8 horas, literalmente o período de sono do motorista. A maior parte dos compradores acaba levando esse equipamento e numa cidade como São Paulo ou Rio, cheia de prédios, será preciso gastar dinheiro para permitir a instalação dos terminais. A Nissan também trabalha para criar uma rede de recarga rápida que leva 30 min para elevar o nível das baterias para 80%.

Ainda na cozinha, tomando o café da manhã, o dono do Leaf pode ativar o aquecimento ou o ar-condicionado enquanto o Leaf está ligado no carregador. Com isso economiza-se energia das baterias e a autonomia ficará menos prejudicada.

O Leaf liga como um carro normal com a chave que dispensa miolo. Aperta-se um botão como o de um aparelho doméstico e pronto. O sistema carrega, mas, claro, não se sente nada. Aliás, esqueça vibração, coisa exclusiva de modelos com motor a combustão.

O câmbio é uma espécie de mouse que você desloca para esquerda e para trás para engatar o D e para frente para a ré. Se voltar a empurrar para trás novamente, o modo Eco é ligado e o carro perde desempenho para mirar na economia.

O freio de estacionamento eletrônico fica na mesma posição do manual, mas nem é preciso desligá-lo já que desacopla automaticamente. A primeira sensação do Leaf é o torque: a aceleração contínua e suave impressiona, apesar de não podermos ir muito longe. Já com o modo Eco o carro parece um 1.0.

De resto, a tocada é relativamente parecida exceto pela ausência de marchas. O que muda mesmo é o gerenciamento da condução. Há vários mostradores eletrônicos sobre o consumo e comportamento do carro para ajudar o motorista a fazer um trajeto eficiente. Se você freia o carro com uma certa progressividade o sistema KERS entra em ação e devolve alguma carga às baterias. Se pretende fazer um caminho longo o sistema de GPS da Nissan lhe mostra até onde você consegue ir com a carga atual. Também informa quantos quilômetros você ganhará se desligar o ar-condicionado, por exemplo.

O silêncio a bordo é imenso a ponto de os faróis terem uma função extra, a de desviar o fluxo de ar dos retrovisores e, assim, reduzir o ruído do vento.

Achamos as baterias

Embora não seja belo – lembra um Tiida com cara de sapo -, o Leaf é o mais próximo do que se imagina de um carro comum. Prius, Volt e i-Miev estão mais para conceitos que carros de série e dizem de cara que não são automóveis comuns. O Nissan passaria despercebido numa pintura comum hoje em dia.

Tudo isso é mérito de um projeto que buscou tirar ao máximo a impressão de se estar abrindo mão de algo em prol do sistema elétrico. Mas a mágica da Nissan se revela em alguns pontos.

O porta-malas, por exemplo, é espaçoso, mas logo se vê que há algo mais lá atrás, uma espécie de viga entre os bancos e compartimento de bagagem. Também não existe estepe no Leaf, que usa o sistema Run-flat, que mantém o pneu em condição de rodagem por mais alguns quilômetros.

Mas é no banco traseiro que se percebe que as baterias estão ali, embaixo dos nossos pés. No Leaf, os passageiros ficam como numa picape média: mais altos e com as pernas encolhidas.

São nada menos que 48 módulos de baterias, cada um com quatro placas de íon de lítio. Só para vocês terem uma idéia, cada módulo tem o tamanho de um laptop. Não é possível vê-los porque toda a base da carroceria é vedada contra umidade. Imagine você a bordo de um Leaf sem isso no meio de um alagamento. A Nissan garante que não há risco nenhum, mas que dá uma impressão estranha, dá.

Se eu teria um? Hoje. Juro que não sou desses naturebas que brigam até por uma folha arrancada de uma árvore, mas confesso que curtiria saber que meu carro não solta fumaça, não faz barulho e não torna uma cidade como São Paulo mais caótica que o normal. Será que esse espírito ecológico vai pegar? Não sei, mas não há boa vontade que faça com que alguém pague cerca de R$ 55.000 pelo Leaf acrescido de R$ 20.000 de imposto de importação mais 25% de IPI, frete, outros impostos, margem da montadora etc.

Vejam só como “nosso país tem visão”. O Leaf paga 25% de IPI porque entra na categoria “Outros”. Se tivesse motor de 1 litro pagaria 7% ou algo assim, mas como não tem motor a combustão o governo brasileiro o considera da mesma forma que um automóvel com motor grande. Acreditem.

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