Já diz o ditado: “não há almoço grátis”. A Peugeot fez quase toda a lição de casa no novo 208, hatch compacto que chega ao nosso mercado apenas um ano depois da Europa, onde faz enorme sucesso – é o 2º carro mais vendido do continente. Só faltou mesmo cobrar um preço mais atraente. Em vez disso, o Peugeot 208 Griffe, mais caro deles, sai pelo mesmo valor de um 308 Allure, que perde apenas em alguns itens.
Comparado ao Peugeot 207, melhor dizendo, ao 206,5, que está conosco desde 1999, o Peugeot 208 o supera em quase tudo. Se o antigo era pesado de dirigir, o 208 é leve e preciso (direção elétrica). Se o 207 judiava dos passageiros o novo é esbanja espaço, se o 207 era um desastre ergonômico (lembra dos acionadores dos vidros no meio do carro?), o 208 tem tudo no lugar (acionadores nas portas) e até coisas a mais. E se o acabamento do 207 não era nenhum luxo o 208 usa bons materiais e soluções. Mas a realidade é que o 208 não veio para o lugar do 207.
Com preços a partir de R$ 39.990, o Peugeot 208 está em outro patamar até porque a primeira versão que vale a pena é a Allure, que custa R$ 45.990. Mas por isso vale a pena gastar um pouco mais e comprar o Griffe que tem motor 1.6 e mais equipamentos. O cheque aí sai por R$ 50.690. Mas por esse preço dá para levar um 308 Active ou um Allure com R$3 mil a mais. Dilema de Tostines esse.
Boas sacadas no interior
Mas vamos lá esquecer um pouco esses números que dão dor de cabeça e falar do carro em si. O 208 nasceu para agradar na Europa, a princípio, mas sua receita casou com a brasileira sobretudo porque a Peugeot soube ouvir as críticas a seus carros e, enfim, acertar o carro para o gosto local.
Isso significa que o 208 não bate a suspensão como outros Peugeot, mas não perde o conforto a bordo. Também se traduz numa direção esportiva que empolga o motorista e sem o peso da antiga direção hidráulica – agora o sistema é elétrico e bem calibrado. Para completar, a Peugeot esqueceu de pensar apenas na beleza exterior para desenhar um carro de dentro para fora. Se no 206/207 nacional a posição ideal de dirigir nem sempre era encontrada com o Peugeot 208 ela é natural. Para ajudar, a marca usou o mesmo recurso da Honda com o painel superior do Civic e deslocou todo o cluster (o painel de instrumentos) para um ângulo acima do volante. É isso mesmo, você não precisa olhar para o meio do volante para ver os instrumentos. Aliás, o volante é ovalado, outra “inspiração” na Honda e com diâmetro mais curto.
O fabuloso nessa história é que estamos falando de componentes usados no novo C3 que, na minha modesta opinião, foram mal ajustados na Citroën. Nem parece que falamos da mesma base. Enquanto a direção do C3 é indecisa – ora pesada, ora leve demais -, no 208 é na medida.
Para levar nota 10 faltou alguém trocar o comando do câmbio manual. Lenta e curso longo, alavanca não combina com agilidade do carro, uma pena.
Telinha show de bola
Apesar de todos esses itens legais, o que chama a atenção é o sistema multimídia. A telinha de 7 polegadas fica numa posição destacada no alto do console central. Além da moldura chamativa ela tem uma interface bacana, quase intuitiva (sim, tem coisas que demoram um pouco para processar na nossa cabeça).
Ela traz tudo que se espera desses sistemas: navegador inteligente por GPS, conexão Bluetooth para ligações e música, conexões para USB e auxiliar além de diversas opções de configuração do sistema. O legal dela é que a resposta ao toque é bem veloz e a iluminação bem viva, ao contrário do MyLink, da GM, que é apagado. Durante o test-drive testamos alguma funções e o destaque ficou para a precisão do GPS, já o ponto negativo para a função que controla as músicas via Bluetooth que não reconhecia play-lists e alguns nomes de músicas, recurso que no manual só existe para conteúdo vindo da entrada USB.
Saliência perigosa
Chamou nossa atenção um pequeno ressalto no assoalho logo atrás do pedal de embreagem. Às vezes essa saliência prendia de leve o pé esquerdo se ele estivesse muito elevado. O tal ressalto existia nos dois modelos que dirigimos.
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Ponto para o motor 1.6
Se o motor 1.5 (na verdade um 1.4) não chegou a comprometer não restou dúvida que o 1.6 Flex Start condiz mais com a personalidade do carro. Com mais torque e elasticidade, o motor é mais um motivo para partir do Griffe.
É um Peugeot?
Perguntamos ao staff da Peugeot se eles não temiam que os consumidores não notassem que o 208 é um Peugeot. Segundo eles, as pesquisas mostraram que mais de 60% das pessoas reconheceram a “paternidade” do carro sem que existissem logos no veículo. É verdade que o formato da carroceria já diz algo sobre sua procedência, mas é fato que o 208 rompe com tudo que se viu na Peugeot há 14 anos.
Parece até ruim, mas é bom. O design do Peugeot 208 não vai causar o mesmo impacto do 206 por inúmeras questões, mas tem algo que o antecessor não tinha que são suas linhas mais clássicas e duradouras. É um carro bonito, mas em que o belo surge em pequenos detalhes como a inscrição “Peugeot” à frente do capô ou no desenho da linha de cintura do carro.
Filosofia da Apple
No final das contas, o Peugeot 208 é um carro legal, que lhe motiva a dirigir, uma vontade que anda apagada nas grandes cidades, tamanha a neurose das ruas. A Peugeot continua na sua cruzada para provar que, sim, ela pode ser confiável e barata de ter. Para isso ela ressalta o “trio da confiança”: garantia longa (3 anos), revisões a preço fixo e custo de manutenção baixo, seja pela nota positiva do Cesvi, do pacote de peças da Anfavea ou pelo seguro de fábrica em conta.
Tudo isso poderia validar a compra do hatch, mas voltamos à questão do preço. Ter essa sensação custa caro hoje. Cobrar muito por um lançamento é regra hoje em qualquer empresa de bens de consumo. Se você começa com o preço lá embaixo significa que não valoriza seu próprio produto. É essa a grande equação que cada potencial consumidor do 208 terá de fazer: “até quanto estou disposto a pagar?”.
Essa percepção de valor é o que decreta o sucesso e o fracasso desses produtos, que dirá a Apple: “você pega um iPhone 5 hoje e compara com o Galaxy e vê que no papel o Samsung é muito superior ao Apple”, explicou um executivo da Peugeot. “Mas isso faz as pessoas deixarem o iPhone? Não porque a percepção de valor de um Apple é imensa”, completa.
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Eis a questão: o 208 é um “Apple” ou um “Samsung”? É o que descobriremos nos próximos meses.
Galeria Peugeot 208
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